Dorsal

Traz o vórtice do movimento ao centro.
As extremidades nada fazem
senão uma dança tempestuosa.
A energia vaza pelas pontas.

Fluido

Vazando fluido pelas palmas.
Deixo imagens radiográficas sobre a mesa fria.
Xilogravando por irradiação de calor.

Os batimentos sincronizam o corpo.
Inteiro afinal!
Sacolejar tão sutil quanto um diapasão
ao ritmo da melodia interna.

Now playing...
Timbalada.

Registros

Chateando o passado,
percebo a estática do tempo.
A tragédia há anos anunciada
ainda rende desdobramentos
igualmente mais maduros e doloridos.

Ao invés de afundar joelhos na terra,
um sorriso me trai a face.
Estragando o clima de desolação
tão laborosamente talhado.

Será sádica a reação de quem se alegra
ao ver a própria carcaça
perdida vagando pelas eras?
Ou a insanidade que finalmente se instala
no corpo assombrado?

Paro e observo.
Um instinto maternal brotando
em solo antes infértil.

Abraço a crianças que chora
copiosamente no escuro.
Em silêncio para não ser descoberta.
O desejo pela morte é prematuro.
Perdoa pois não sabe o que pensas.

Todo afago,
mesmo os metafísicos-metafóricos
atravessam bidirecionalmente.

Compreendo o lapso bucal.
Dou espaço ao infante,
agora sonolento,
em meu leito.

A solidão se esvai.
Vou dormir
um pouco menos pesaroso
com o amanhã.

I accept

This frail body.This simple mind.
The character flaws.

The greed.
The vanity.
And all the other sins.

I won't deny sunshine
to any shameful part.
Because as of today

I retired the whipping post.
The wounds will get to heal
eventually.

(Don't) Disappear

Reject every imperfection.
Scratch them away
until there's nothing left.
Obliteration.

Joy isn't the sense of plentifullness,
the lack of empty spaces.
But bearing being naked.
Incomplete.

Closer

I still need
a smidge of fake hope
to get by the day.

Slow progress has been made
in forging the real thing.
But I get closer
every single day.

Desprende

Solta.
A força de atrito contra a corda
queima a pela na descida brusca.

Larga.
O medo-bigorna fará da queda livre
coiote-panqueca.

Flutua.
Com as mãos livre de obrigação e bagagem,
abre os braços
e se entrega à correnteza.

Paz

As feridas latejam, mas o sangue que corre abaixo
já não está mais impregnado de cólera.
Metabólitos inativos indicam sua presença anterior.
O silência no cenário pós-combate.

Desacelera

O gozo prende.
A voz engasga.
O pé emperra.
A mente pifa.

Dirige com a primeira
até chegar em casa.

En/stranha

Um polvo dentro da minha barriga.
Antes fosse produto de simples deglutição.
Internamente externo.
Entre serosas e não mucosas.
Comprimido entre estômago e diafragma.

A curiosidade da procedência é alternada pelo embaraço.
Como tal criatura passou despercebida por tanto tempo?

Em retrospecto as pulsações já eram indícios antigos.
Ouvia de tudo, menos os gritos internos.
A consequência de correr de si uma hora nos alcança.

Agora não há outra solução
senão analisar o espécime.
Convido-o educadamente a sair.
Qual minha surpresa quando a mão estendida
encontra tentáculos receptivos!

Em ar ambiente percebo algo de errado.
Apesar da falta de expertise em zoologia,
noto algo que poderia ser chamado de prostração.
Avalio a cavidade que vem fazendo de residência.
Pus, muco, inflamação e tinta.

Estaria o cefalópode fazendo mal a mim
Ou eu a ele?
Elucubrações à parte, medidas precisavam ser tomadas.
Lavagem, limpeza, assepsia de ambos.

Sobreviveremos afinal.
As pulsações se acalmam,
a prostração diminui.

A última etapa... Destino final?
Aquário, praia, alto mar...
Pergunto-me debruçado ao futuro viajante.
Suas projeções tentam alcançar o espaço virtual que habitava.
Como quem suplica pelo habitat natural.

Seria este ser produto de uma gestação estapafúrdia em andamento?
Ou ainda parte integrante da minha pessoa?
Variação anatômica?
Faltam respostas sobram perguntas.

De toda forma já estava acostumado a servir de moradia.
Mesmo que não consciente de sua presença.
Acolho com a condição de observar atentamente.
Na presença de indícios de depredação de propriedade
a expulsão será mandatória.

Um tentáculo à testa sugere concordância com os termos de consentimento.
O inquilino retorna, satisfeito.
O senhorio, perplexo,
sorri.

Ritmo

Ao se aproximar de sua felicidade,
não fique preguiçoso.
Gratificação e melhoramento pessoal
caminham na mesma direção,
porém retas distintas, paralelas.

Eterna retidão que se perde no horizonte.
Inacreditavelmente interminável.
Pequenas pistas de uma vida melhor
difícil de enxergar sobre o fundo monocromático.
Desanimador.

Contraposta por uma fila de pequenos tracejos.
Mini recompensas ao final de cada segmento.
Montar lar na fronteira com qualquer vazio
evitaria muitos passos dolorosos.
Tentador.

Seguir trajetória única seria desgaste excessivo.
Aproveita a disposição do terreno e intercala passos.
Recarrega suprimentos e descansa para enfrentar a escuridão
e desviar dos precipícios.

Silt

O sofrimento enaltece a alma,
exceto quando é auto-infligido.
Ninguém sabe o que merecemos,
a não ser a vida.

E as grandes catástrofes?
As dores estúpidas e sem limites?
A miséria extrema e tantos outros males injustos?

O grão de areia pergunta à praia.
E antes de ser engolido pelo mar,
suspira resignado.

Pouco antes de desaparecer
diluído na espuma,
entende.

Insuportável seria
se partículas de sedimento competissem.
Sedimentos são

Linger

It hurts to let you go,
even though you already left.
The thought of you turning around
with me having set sail
crushes my soul.

I still need the thought of us lasting forever.

Ugly

I live like the others depend on me.
As if they wouldn't survive
if not for my selfless giving.

I name thee Fake Humble!
Conceited as shit.
I make as little difference as the next.

I wish people depend on me
so they couldn't leave.
Forever praising my glories.

But I'm ever so common.
And I should just accept it.

Feio

Condicionado a agradar,
obedecer e cuidar.
Esperar recompensas é indelicado.

Sou um cão que saliva
ao toque da campainha.

Delivery

Quanto tempo mais
até a iluminação divina?
"Nirvana express:
Sua epifania em 30 segundos,
ou seu produto de graça."

Fodam-se todos corações partidos!
Vou remendar o meu próprio
e o resto que se exploda!

Débito ou crédito, senhor?
Débito, por favor...

Feel

I feel sad.
I am one.
Wishing were two.

I feel empty.
Life is OK,
yet it hurts.

I feel lonely.
Can one be enough?
Prayer.

Morfose

Uma pequena fresta para começar.
Por debaixo da porta, um fino feixe de luz.
O suficiente para sinalizar existência.

Poucos ampères, porém sem traços de flúor.
Partículas de carbono incandescente...
Matéria orgânica, sem sombra de dúvida.

A massa ainda amorfa suspira aliviada.
Ainda presa e sem contorno,
porém com sistema de ventilação garantido.

A sobrevivência do espécime se prolonga por mais um dia.

Instante

Livres são as palavras!

A caixa de brinquedos que voa pelo ar.
Tutu, vento cambalacho, pocilga.
Para desespero dos adultos
e alegria das crianças.

Guarda-roupa

O que podemos ser hoje?

Vaidosos, convencidos, orgulhosos;
Auto-depreciativos, deprimidos, suicidas;
Humildes, corteses, caridosos;
Sedutores, lascivos, pervertidos;
Omissos, relapsos, esquecidos;
Indiferentes, apáticos, hipobúlicos;
 Explosivos, raivosos, agressivos.

Endtedia-me o monocromático.
O contraste de cores aberrantes
pode trazer novas dimensões.
Afinal, um dia sedutoramente agressivo e caridoso
torna qualquer resultado muito mais imprevisível!

Intervalo

Sangrando tinta
para poupar a pele.

A dor alude ao monstro que se gesta.
Sangrias pós-contemporâneas.
Quirodáctilos afiados no lugar de anelídeos
para acalmar os humores.

A besta pulsa.
O corpo estranha.

Percebendo vazios

A dor provocada por lanças de queratina.
O êxtase sem culpa.
Não entro mais em luto pelo sangue derramado,
pelas soluções de continuidade.
Caminho a passos longos
rumo à iluminação divina
ou à beira do precipício?

Cave um pouco mais fundo,
mate mais algumas células.
Familiarizando-se com a dor
talvez se torne menos hostil
quando o mundo lhe encara.

Será o medo da rejeição
a fonte de todos os males?
Qual seria o sentido de lançar pseudópodos
incessantemente na busca de contatos imediatos?

(A mente preenchida não grita à alma.)

Roundabout

When you run too much
you'll eventually end up running in circles
completely losing the purpose of the rush.
Walk slowly, but in a straight line.
Or an uncertain wobbly one, it doesn't matter.
Just be aware of your own steps.
And if you ever get to slow down,
don't apologize for existing.

Ghostrunner

Pelo canto dos olhos
vejo um vulto deformado no espelho.
Temo que seja meu próprio reflexo.
Cubro com um pano e tento seguir a vida.

Sorrio e ando apressado.
Um olhar dissimulado, mas feliz, evita perguntas.
O passo apertado quase desloca a alma do corpo.
Correndo de aproximações e pensamentos
mato dois coelhos.

As pernas cansam, o coração grita.
Pouco importa.
Mesmo que pudesse parar
não há abrigo num raio de quilômetros.
Só resta continuar vagando.

Regret

As long as I hurt
I'll hurt the nearest.
I may try to stop
by just holding back.
We know it won't work
and you'll resent me like hell.

My apologies are heartfelt,
though with little effect.
I try to soothe my conscience,
but I can't heal your pain.
I do realize
I'm most to blame here.

I'll stop begging for crumbs
of love and attention.
Crawl to a quiet cave.
Attend to my own wounds.
I want to thank you for the ride.
Hope I didn't scar you for life.